O que se faz numa  Vindima

A História de setembro é sobre as Vindimas e o Vinho Verde. E, como explica Elsa Costa e Silva, não é por acaso que é a reportagem deste mês: porque o tempo de se vindimar em outubro já lá vai. As consequências das alterações climáticas já se fazem sentir e estima-se que continuem a ter impacto na produção de vinho verde nas próximas décadas. E algumas até podem não parecer negativas num primeiro momento, mas, quando percebidos os efeitos na “marca”, o cenário muda. 

Esta é uma História sobre o negócio, é certo, mas também sobre as pessoas: os trabalhadores e trabalhadoras que colhem as uvas. Porque não se pode falar de Vindimas sem a gente que as faz. São certamente muitas as histórias que nos virão à memória, porque dificilmente se encontrará em Amarante quem nunca tenha participado numa vindima: dos pais, avós, vizinhos ou amigos. Estes serão retratos de Convívio e Comunidade. Retratos de Festa. Os de hoje, por certo, diferentes dos da infância, mas iguais em muitos aspetos. Nessa altura, como agora, tudo começava bem cedo, para evitar o calor. Os adultos vindimavam com escadotes e a nós, aos mais pequenos, cabia-nos a tarefa de apanhar bagos. O que aceitávamos com desalento, porque o que queríamos realmente era subir escadotes e usar tesouras e canivetes. A meio da manhã já apertava a fome e, por isso, comia-se e bebia-se o verde que sobrasse do ano anterior, para ganhar ânimo para continuar a jornada. Lembro-me de almoços de feijoada – de um porco lá da casa -, de se tocar e cantar pela noite dentro, enquanto se pisava uvas num lagar. E lembro-me do ano em que pude pisá-las também, porque já tinha idade para isso. E estavam lá todos: avós, pais, tios e tias, primos e primas, vizinhos e vizinhas. E nos fins de semana seguintes, tal como nos anteriores, fazia-se a vindima noutra casa do lugar. Era, e ainda hoje é, uma tarefa comunitária. Para muitos, é o ponto de encontro anual. Em muitos casos, certamente, um motivo para celebrar e convidar os amigos, porque a vindima, essa, nos dias de hoje, até já se faria só com os da casa. 

Mas a história da Vindima também é uma história da evolução económica e social. Uma história do que somos e temos sido como sociedade. Uma história sobre a desigualdade. Recordemos apenas a “Vindima” de Miguel Torga, um relato de exploração, dureza e hipocrisia. E, de 1945 até aos dias de hoje, esta realidade continua a ser-nos trazida com demasiada frequência pelos media, agora com relatos de migrantes e de tráfico de seres humanos. 

Mas não é sobre isto a História que conta a Elsa Costa e Silva. A nossa reportagem de setembro é sobre o presente e o futuro do vinho verde em Amarante, o que pode vir a ser. É a História do que faz numa vindima: cria-se um produto e sustenta-se um negócio, mas não só. Porque não é um produto qualquer. É delicado e é um símbolo, uma marca. De uma região, de um modo de fazer. Faz-se muito numa vindima, para além de colher uvas.