A Revolução contada há 50 anos pelo Flor do Tâmega

“O Movimento das Forças Armadas pôs termo ao fascismo em Portugal. 25 de Abril de 1974”. A cobrir toda a primeira página, lia-se a vermelho: “O Povo Unido Jamais Será vencido”. Foi assim que, há 50 anos, a 5 de maio, o jornal Flor do Tâmega noticiou a Revolução dos Cravos. Apenas 10 dias depois (imaginamos que nesse período o trabalho terá estado suspenso), contou-se a história dos acontecimentos que ocorreram no país e retratou-se a forma como o 25 de Abril foi vivido em Amarante.

Como aconteceu em muitos locais, a Revolução só saiu à rua uns dias mais tarde, a 27 de abril, numa manifestação que começou no Largo da Estação, seguiu pela Cândido dos Reis, 5 de Outubro, Largo de S.Gonçalo, atravessou a Ponte, desceu a 31 de Janeiro, foi fazendo paragens em frente à casa “de republicanos convictos”, contornou o Largo Conselheiro António Cândido, seguiu para a Avenida General Silveira e acabou junto à estátua de António do Lago Cerqueira. Aqui, houve discursos e a deposição de um ramo. Relata-se que o cortejo foi acompanhado pelo som  (de muitos elementos) da Banda de Amarante e de flores, lançadas das casas. E lamenta-se que os correspondentes dos diários nacionais não tenham noticiado o evento. Mas também se percebe que a vida continuou e que já se falava das “Festas da Vila”,  que estavam à espreita. 

Foto da manifestação de 27 de abril, publicada pelo jornal Flor do Tâmega na edição de 5 de maio. Não está identificado autor, mas poderá se ser Eduardo Teixeira Pinto

As edições seguintes do jornal Flor do Tâmega espelham os debates e movimentações que se desencadearam na sociedade civil: a publicação de artigos – por exemplo, uma série de A. Magalhães – sobre o final da censura e o papel da Imprensa, a vida em Democracia e debates – mais ou menos acesos – sobre o futuro do país e da cidade.

A edição de 19 de maio dá conta da nomeação e eleição de uma Comissão Administrativa para substituir “a gerência da Câmara de Amarante”, com Celso Pimenta de Freitas como presidente. O Flor do Tâmega regista ainda que António de Spínola assumiu, a 15 de maio, a função de Presidente da República e “presta-lhe as suas homenagens”.

A Revolução continua na primeira página da edição de 26 de maio – e continuou por muitas outras – mas já a reparte com as Festas do Junho – bem presente nas páginas interiores – e dá-se notícia de um movimento de organização dos professores do concelho, reunidos, a 18 de maio, no ginásio do Colégio de S. Gonçalo, sob o lema “o professor unido jamais será esquecido” e com o objetivo de escolherem representantes sindicais tendo em vista reivindicações laborais.

Primeiras páginas das edições de 12 de maio, 19 de maio, 26 de maio e 9 de junho



Um ano depois, a eleição para a Assembleia Constituinte

A Revolução e as suas consequências não abandonaram as páginas do Flor do Tâmega durante os meses que se seguiram. Um ano depois, na edição de 27 de abril de 1975, noticia-se a promulgação do dia 25 de abril como “feriado nacional obrigatório”, “ficando inscrito no calendário com carácter permanente” e designado como “Dia de Portugal”. É noticiada a decisão do Conselho de Ministros de congelar o preço de alguns bens essenciais até ao final do ano e pode ainda ler-se um artigo que defende o modelo de cooperativa agrícola.

 Primeira página das edições de 27 de abril e 4 de maio de 1975 do jornal Flor do Tâmega

O destaque da edição de 4 maio vai, como seria de esperar, para a eleição do dia 25 de abril para a Assembleia Constituinte. À luz dos nossos dias, estranhar-se-ia que esse não tenha sido o grande assunto da edição do dia 27. Mas os tempos eram outros e a capacidade de seguir a atualidade era também diferente. Vale a pena ler com mais detalhe o artigo intitulado “Votar. O mais belo gesto da gente amarantina”.

Nas páginas interiores, são reportados os resultados da eleição no concelho de Amarante, diferentes dos nacionais: enquanto que, a nível nacional, o PS foi o partido mais votado e quem mais deputados elegeu, em Amarante foi o PPD (com 10448 votos), seguido do PS (com 7037).

Nesta edição, é ainda publicada uma nota sobre a comemoração do 1.º de Maio – celebrado pela primeira vez em todo o país, “desde a grande cidade à vila mais pequena do interior”, e abertamente – ficando a promessa de uma cobertura completa do acontecimento na edição seguinte.

Este texto contou com a colaboração do Arquivo Municipal de Amarante, em particular com a disponibilidade de Ana Pereira, funcionária do Arquivo.